Enquanto mais de 60 milhões de brasileiros vivem na pobreza, o número de pessoas em situação de insegurança alimentar foi de 64 milhões no último ano, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
A semelhança desses dados não é mera coincidência. Isso porque pobreza e fome são problemas que caminham juntos. Ambas afetam o cotidiano de inúmeras famílias, determinando não só o que comem, mas também suas qualidade de vida e oportunidades de um futuro melhor.
Como se define pobreza?
A pobreza não se resume simplesmente à falta de dinheiro; trata-se de uma condição complexa que envolve vários aspectos além da escassez financeira. No Pacto Contra a Fome, consideramos que a privação de recursos e oportunidades que impede as pessoas de atingirem uma condição de vida digna e satisfatória também faz parte do problema.
Essa privação vai além da simples falta de renda, trata-se de um problema multidimensional que está relacionada à ausência de acesso a direitos básicos como alimentação adequada, moradia digna, trabalho decente, educação de qualidade e cuidados de saúde.
Também não existe uma única definição de pobreza. Esse conceito varia de acordo com o contexto cultural, econômico e social de cada país ou região. Mas, no geral, o termo pode ser categorizado em dois tipos: pobreza absoluta e pobreza relativa.
A pobreza absoluta acontece quando uma família não consegue garantir recursos e serviços básicos para sobreviver, como água potável, alimentos adequados, habitação, saúde, educação, transportes, entre outros.
Por sua vez, a pobreza relativa considera a posição econômica de uma pessoa em comparação com outras na sociedade em que vive. Sob essa perspectiva, mesmo que uma pessoa tenha recursos suficientes para satisfazer suas necessidades básicas, ela ainda pode ser considerada pobre se sua renda ou condição de vida for inferior à média da população.
Como a pobreza é medida
A medição da pobreza é um desafio para pesquisadores e organizações de todo o mundo. O indicador de pobreza monetária é estabelecido pelo Banco Mundial, sendo um dos principais parâmetros utilizados.
Para a instituição, famílias que possuem rendimento diário de até US$ 6,85 por pessoa se encontram na faixa da pobreza. Os lares em que o valor cai para até US$ 2,15 por indivíduo, são considerados em situação de extrema pobreza. No Brasil, os dados do IBGE relacionados à pobreza seguem a definição do Banco Mundial.
Independentemente da régua utilizada, a análise da pobreza tem que ir além da renda, considerando a desigualdade na distribuição dos recursos – um aumento na renda média não necessariamente reduz a pobreza se esta não for distribuída de maneira equitativa entre a população. Isso significa que mesmo em sociedades onde a renda média é elevada, a pobreza e a falta de acesso a alimentos e serviços básicos podem persistir se a divisão não for justa.
Principais causas da pobreza
A pobreza é um problema multidimensional, causado por uma série de fatores conectados. Além disso, é importante destacar que a pobreza não é apenas uma questão econômica, envolve dimensões sociais, históricas, culturais e políticas.
A pobreza está relacionada à desigualdade econômica, que tem como característica a concentração de riquezas nas mãos de poucos enquanto a maioria da população tem dificuldade de acesso a serviços básicos.
Outro fator que contribui para a escassez de recursos é a falta de acesso à educação – uma das ferramentas mais poderosas para romper o ciclo da pobreza. Sem uma educação de qualidade, as pessoas têm suas oportunidades de trabalho e desenvolvimento pessoal limitadas, tornando ainda mais difícil a superação da pobreza.
Desemprego e o predomínio de subempregos precários e mal remunerados são outros fatores que prendem a pessoa na armadilha da pobreza. Sem trabalho ou com salários baixos, a população pobre enfrenta dificuldades para sustentar suas famílias e melhorar seu modo de vida. Algumas outras causas ligadas à pobreza são má administração pública e corrupção, falta de infraestrutura básica, discriminação social, crises políticas, desastres naturais e conflitos armados.
Esses fatores, combinados, criam um ciclo de pobreza que é difícil de romper. Nesse fenômeno, as condições de vida precárias se perpetuam, dificultando a ascensão social. Famílias pobres têm acesso limitado à educação e à saúde, o que compromete as oportunidades de emprego. Consequentemente, as crianças que crescem nesse ambiente tendem a não ter acesso a uma educação de qualidade, perpetuando a pobreza de geração em geração.
Pobreza no Brasil: dados para entender o problema
Mais de 60 milhões de brasileiros viviam em situação de pobreza em 2023, o que representa cerca de 28% da população, de acordo com os dados mais recentes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua) do IBGE. As regiões Norte e Nordeste são as mais afetadas pela pobreza e pobreza extrema.
Essa taxa representa uma queda de 6,7 pontos percentuais em comparação a 2012, início da série histórica da PNAD Contínua – são 8,3 milhões de pessoas a menos.
Entretanto, segundo análises do Instituto Brasileiro de Economia (FGV IBRE), essa redução não aconteceu de maneira uniforme no país. A pandemia, por exemplo, causou um aumento no número de pessoas em extrema pobreza, especialmente na região Nordeste.
Desde o ano de 2021, quase 18 milhões de pessoas saíram dessa margem, o equivalente a uma redução de quase 23% em dois anos. Nesse período, o Nordeste teve a maior redução (48%).
Índices de pobreza
Índices de pobreza são métricas usadas para medir a proporção de pessoas que vivem com renda abaixo do nível mínimo necessário para atender às necessidades básicas. No Brasil, um deles é definido pelo IBGE com base em indicadores do Banco Mundial, e indica que, no último ano, a quantidade de pessoas vivendo com menos de R$2,00 no Brasil caiu para 27,5% – a menor taxa já registrada desde o início da PNAD Contínua em 2012.
Linha da pobreza
A linha da pobreza é o critério econômico utilizado para definir o limite mínimo de renda necessário para que uma família possa atender às suas necessidades básicas, também medida pelo nível monetário. Aqueles que vivem abaixo dessa linha são considerados pobres, enquanto os que vivem muito abaixo são classificados como em situação de extrema pobreza.
Seguindo os indicadores do Banco Mundial, em 2023, a linha de pobreza do Brasil foi estabelecida em R$ 667 mensais por indivíduo. Uma pessoa com uma renda menor do que R$ 209 mensais vive abaixo da linha de extrema pobreza.
Consequências da pobreza: ligação entre pobreza e fome
A fome é um dos aspectos mais críticos e visíveis da pobreza. Ela não se limita à quantidade de alimentos disponíveis, mas também à qualidade e à adequação nutricional desses alimentos – famílias em situação de insegurança alimentar podem ter comida em quantidade suficiente, mas com baixo valor nutricional, o que pode levar à desnutrição e a outras doenças relacionadas.
Esse fenômeno é o que chamamos de “fome oculta”, e é particularmente prevalente em comunidades de baixa renda, onde alimentos ricos em calorias, mas pobres em nutrientes, são mais baratos e mais acessíveis do que os saudáveis.
Por isso, a pobreza está relacionada a um aumento de problemas de saúde, como doenças crônicas causadas pela alimentação inadequada, menos acesso à atenção médica e piores condições de moradia. Um estudo recente indica que a pobreza tem um impacto tão negativo na saúde quanto doenças como obesidade, alcoolismo e hipertensão.
Quais são os caminhos para o combate à pobreza no Brasil?
A luta contra a pobreza no Brasil é essencial para erradicar a fome e garantir que todas as pessoas tenham acesso a uma alimentação saudável e adequada. Sua interdependência ressalta a necessidade de políticas públicas que abordem simultaneamente a pobreza e a insegurança alimentar. Isso porque medidas baseadas apenas na renda são insuficientes para capturar toda a complexidade de ambos problemas.
Uma abordagem ampla, que considere os múltiplos fatores que contribuem para a insegurança alimentar, incluindo a educação, a igualdade de gênero e raça, e o acesso a serviços básicos, é necessária.
Portanto, a defesa de políticas públicas mais justas e inclusivas é fundamental. Isso inclui pressionar o poder público por melhorias em áreas essenciais para tirar as pessoas da miséria, como alimentação, educação, saúde e habitação. Nas eleições, por exemplo, uma forma de atuação cidadã é votar em candidatos e candidatas que priorizem essas questões.
Outra ação importante é a promoção de práticas sustentáveis, o incentivo ao consumo consciente e o apoio ao comércio local, que fortalecem economias regionais e criam oportunidades para todos. A participação ativa em organizações sociais também é uma forma de contribuir. Com o objetivo de aprofundar o debate sobre o tema e trazer mais clareza sobre o assunto, nosso time de Inteligência elaborou o estudo “Pobreza: uma breve discussão”, com mais informações detalhadas sobre suas causas, consequências e possíveis soluções. Confira: