Atuando como uma ponte entre o governo e a população, o Consea tem sido um elemento central na construção de políticas públicas de combate à fome no Brasil. Nas últimas décadas, suas ações contribuíram diretamente para a melhoria das condições de vida de milhões de brasileiros.
Neste artigo, entenda o que é o Consea, como o órgão atua, quais são suas principais funções e por que exerce um papel estratégico no combate à insegurança alimentar no país.
O que é o Consea?
A sigla Consea significa Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional. Ele é um órgão de assessoramento imediato à Presidência da República nos temas relacionados ao acesso a alimentos no país.
De caráter consultivo, o conselho tem o objetivo de monitorar e acompanhar a implementação das políticas de segurança alimentar e nutricional, engajando a população a participar dessas ações governamentais.
O Consea integra uma estrutura nacional ainda maior: o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (Sisan), um sistema de gestão intersetorial que elabora, coordena, monitora e avalia políticas públicas, articulando os três níveis de governo (federal, estadual e municipal) e as organizações da sociedade civil.
Um dos requisitos para os governos aderirem ao Sisan é a criação de um conselho estadual, distrital ou municipal de segurança alimentar e nutricional no nível local, com funções semelhantes às do Consea nacional.
O Consea foi criado em 1993, no governo de Itamar Franco. A proposta surgiu a partir da Política Nacional de Segurança Alimentar, um documento elaborado em 1991 pelo chamado governo paralelo – instrumento de oposição à gestão de Fernando Collor, com objetivo de revisar os programas federais de segurança alimentar e criar um plano de combate à fome e à miséria.
Em 1994, o então presidente Fernando Henrique Cardoso destituiu o Consea, criando em seu lugar o Programa Comunidade Solidária. O conselho foi recriado no primeiro governo Lula por meio do Programa Fome Zero, em 2003.
Principais funções do Consea
O Consea exerce a função de atuar na elaboração, monitoramento e avaliação da Política e do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN), garantindo a participação ativa da sociedade civil na gestão e fiscalização das políticas públicas.
De acordo com legislação que rege o conselho, entre as atribuições do Consea, estão:
- Convocar e organizar a Conferência Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional;
- Propor as diretrizes e prioridades da Política e do Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional à Câmara Interministerial de SAN, a partir das deliberações da Conferência Nacional de SAN;
- Articular, acompanhar e monitorar as ações relacionadas à Política e ao Plano Nacional de SAN;
- Definir, junto com a Câmara Interministerial de SAN, os critérios e procedimentos de adesão ao Sisan;
- Mobilizar e apoiar as entidades da sociedade civil na discussão e na implementação da Política Nacional de SAN.
Como o Consea funciona na prática
O Consea é um espaço de participação social que funciona de forma colegiada, reunindo representantes do governo e da sociedade civil em pé de igualdade para discutir, formular e propor políticas públicas voltadas à segurança alimentar.
O conselho é composto por 60 conselheiros, entre titulares e suplentes. A maior parte – dois terços – representa organizações da sociedade civil, enquanto o restante é formado por membros da União.
A presidência do órgão é exercida por uma pessoa da sociedade civil, escolhida entre os conselheiros e indicada oficialmente pela Presidência da República. A atuação dos membros do Consea não é remunerada, sendo considerada um serviço público relevante.
O funcionamento do Consea se dá por meio de reuniões ordinárias ao longo do ano, que reúnem todos os conselheiros para debater e tomar decisões coletivas sobre temas estratégicos.
A partir das discussões, o Consea elabora recomendações, resoluções e exposições de motivos que são encaminhadas ao Governo Federal e a diferentes ministérios. Esses documentos orientam decisões e políticas relacionadas ao combate à fome e à pobreza, promoção da agricultura familiar, direito humano à alimentação adequada, apoio a povos e comunidades tradicionais, entre outros.
Outro pilar do funcionamento do Consea são as Conferências Nacionais de Segurança Alimentar e Nutricional, que definem diretrizes para a política nacional com base na participação da sociedade civil e do poder público.
A 6ª e última edição, realizada em 2023, marcou a retomada desse espaço de mobilização social, com o tema “Erradicar a fome e garantir direitos com Comida de Verdade, Democracia e Equidade”.
A extinção e o retorno do Consea
Atuando de forma contínua desde 2003, o Consea teve suas atividades interrompidas durante o governo de Jair Bolsonaro. Em 2019, um dos primeiros atos do então presidente foi extinguir o conselho da nova estrutura ministerial, transferindo a coordenação da política nacional de segurança alimentar e nutricional para o Ministério da Cidadania.
A medida provocou reações em todo o país, com manifestações de apoio ao conselho por parte de diversas organizações, incluindo a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO).
A desativação do Consea foi acompanhada pela redução de recursos para ações de promoção da segurança alimentar, como o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) e o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf).
Em 2023, o Consea foi retomado na gestão Lula, como parte das medidas do governo para reconstruir as políticas de combate à fome no país. A medida integrou uma resposta mais ampla à volta do Brasil ao Mapa da Fome: o Plano Brasil Sem Fome, iniciativa que articula dezenas de ações e programas para reduzir a insegurança alimentar.
Consea no enfrentamento da insegurança alimentar
O Consea tem um papel essencial na formulação e implementação de políticas públicas voltadas para o combate à insegurança alimentar no Brasil, sendo uma instância fundamental na articulação de ações intergovernamentais e da sociedade civil.
Uma das primeiras contribuições do conselho foi a aprovação da Lei Orgânica da Segurança Alimentar e Nutricional (LOSAN) em 2006, que implantou o Sisan como um mecanismo de articulação das políticas contra a fome.
Mais tarde, o Consea foi responsável pela Emenda Constitucional nº 64 em 2010, que consolidou o direito à alimentação adequada como um direito constitucional. O órgão também formulou a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PNSAN), que definiu diretrizes e parâmetros para a implementação de ações integradas na área.
O conselho está envolvido na criação do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), que incentiva a compra de produtos da agricultura familiar e a redistribuição para populações vulneráveis. A atuação do órgão ainda fortaleceu iniciativas de financiamento para pequenos produtores.
Na área da educação, o Consea garantiu que, no mínimo, 30% dos recursos federais para a compra da merenda escolar sejam destinados à compra de produtos da agricultura familiar, além de tornar obrigatória a presença de nutricionistas nas escolas públicas. Antes do período de desativação do órgão, as políticas públicas resultantes do Consea para ampliar o acesso a alimentos saudáveis no Brasil contribuíram para a saída do país do Mapa da Fome da ONU em 2014, além de se tornarem referências mundiais no combate à fome.